domingo, 28 de novembro de 2010

Chicabon do desprezo

Nada mais insuportável do que o momento em que nosso desejo irrefreável esbarra naquela velha realidade que vem do banco ao lado:

_Peraí, calma, somos muito amigos, isso não pode ser, calma, isso não vai dar certo!

E aquelas duas garras nos afastam pra longe, quase para fora do carro, deixando-nos com cara de panaca, abestalhados, no acostamento mais insalubre, a chupar o frio chicabon do desprezo.

A nossa paudurescência (neologismo que consolida o momento de ereção enquanto essência do macho) sofre um golpe brutal. Despencamos. O efeito da vodca e do chope vai embora num segundo. E naquele instante mesmo já começamos a ensaiar a dor de consciência do dia seguinte. Que merda.

Isso é o roteiro óbvio, tantas vezes repetidos e ao qual estamos sujeitos desde que inventamos essa história de ser amigo de mulher. É possível, sim, esse tal entrelaçamento fraterno e "cabeça", mas chega um dia, uma noite, que a natureza grita mais alto. É possível, sim, esse tipo de amizade, embora a sociologia cotidiana nos mostra que se trata de um típico fenômeno classe-média, coisa de bacanas - pois não vemos, com a mesma frequência, um pedreiro de tititi com uma amiguinha. Nesse sentido, o proletariado não joga amistosos.

O ideal é fazer um bem-bolado entre a nossa bela educação, afinal estamos sujeitos aos códigos sociais que nos livram da barbárie, e a vontade nietzchiana do pedreiro - aqui não vai preconceito algum, é que meu tio, hoje aposentado da safadeza, já exerceu esse mesmo ofício e se espanta como as novas gerações de marmanjo conseguem ser amigo das mulheres. Como lidar então com o embaraço?

Lembre-se sempre: ninguém come inimigo. A única história desse jeito que conhecemos é a dos índios que devoraram uns jesuítas metidos a catequizadores. Como não se leva à cama inimigos, nada mais natural que o sexo selvagem com as nossas amigas.

Outra desculpa feminina sobre a não-transa entre amigos é o riso. "Imagina, eu e você na cama, vamos nos acabar de rir!", dizem as gazelas. Aí perguntamos, algum problema em rir na cama? Por acaso gostas de sexo com lágrimas? E assim mais um contra-argumento cai por terra diante da imbatível obviedade. Mas o melhor mesmo é reagir, com a frase certa, logo no momento em que a tentativa e o desejo esbarrarem nos ditos laços fraternos.

Ela diz: "Ah, somos amigos..."Ao que você rebate, de primeira, sem deixar a peteca cair: "Não tem problema, qué-qué-isso? Na boa, vamos esragar essa amizade!"

No momento do cigarro (até os não-fumantes acendem seus cigarros imagináriosno pós-sexo), você ainda pode celebrar com uma máxima clássica: "Quando o amor nos visita, a amizade se despede".